sábado, 8 de novembro de 2008

HISTÓRIA DO DIA nº51 O Alfaiate de Bagdad (VER MAIS EM www.historiadodia.pt)


O Alfaiate de Bagdad

António Torrado
escreveu

Cristina Malaquias
ilustrou


Lá para as terras de Bagdad, que um poderoso sultão governava, havia um alfaiate que tinha um filho tão ou mais hábil do que o pai nas artes de alfaiataria.
A bem dizer, o rapaz não era filho de alfaiate. Encontrara-o ele, bebé ainda, dentro de um cestinho, à sua porta, abandonado sabe-se lá por quem. Mas tanto fazia.

Recolhido e amimado, o menino crescera na casa acolhedora do velho alfaiate, sem nunca saber a sua verdadeira origem.
Quando o pai adoptivo morreu, o jovem prosseguiu o ofício que aprendera do seu protector. Ganhou fama profissional, tanta que de longes terras vinham encomendar-lhe fatos e túnicas dos mais finos tecidos.

Um dia, um escravo de sabre em punho veio buscá-lo para que fosse com ele a determinado sítio, para receber uma encomenda.
- Leva a tua melhor tesoura, porque a freguesia é exigente - recomendou-lhe o escravo.

Mas, para que o alfaiate não ficasse a saber o caminho nem localizasse o cliente, vendou-lhe os olhos com um lenço.
Levou-o assim ao harém privado do sultão, onde, depois de tirar-lhe a venda, o apresentou às favoritas do sultão.

O rapaz ficou de olhos esbugalhados, com tanta beleza à sua volta. Não sabia onde estava, mas desconfiou.
As favoritas, de rosto velado, encomendaram-lhe um nunca mais acabar de vestidos. Estava ele a tirar as medidas, um bocado atordoado com a aventura, quando se abriu a porta. Era sultão.

- Que está aqui a fazer este desgraçado? - perguntou o sultão, furioso.
Não houve explicações que o satisfizessem. Nenhum homem senão ele podia frequentar aquelas salas do palácio. Quem perdesse a cabeça e arriscasse, perdia mesmo a cabeça, de verdade.

- Mas antes de cortarem a cabeça ao intruso, chicoteiem-no com cem vergastadas - ordenou o sultão.
Assim se dispunham a fazer quando o rapaz, tentando salvar a vida, arrancou o sabre das mãos do escravo que o trouxera e fez frente aos guardas. Tão hábil era ele a manejar a tesoura como o sabre.

Um a um, derrubou os opositores. Chegando à beira do sultão, que estava desarmado, dispunha-se a trespassá-lo. Outra solução não tinha. Ou matava ou era morto.
Nisto, uma das favoritas reparou, por um dos rasgões da camisa, estraçalhada na luta, que o rapaz tinha nas costas um singular sinal em forma de ananás.

- É o sinal da realeza - gritou ela. - Não mates o sultão que ele é teu pai.
Mas já o jovem alfaiate tinha acertado um profundo golpe no peito do sultão.
Suspendeu-se à beira de vibrar o segundo.
Foi-se ver e era verdade.

Um adivinho predissera, no nascimento do príncipe, que aquele menino iria pôr em perigo a vida do pai. Por isso é que se tinham desembaraçado dele, em criança.
O velho sultão, a esvair-se em sangue, foi socorrido pelos médicos da corte. Salvaram-no. Safou-se, mas ficou muito fracalhote, daí em diante.

O alfaiate, agora príncipe, ocupou o seu lugar à frente do reino. Passou a governar com mais senso e justiça do que o pai. Nos intervalos da governação, talhava vestidos. No harém, as favoritas cosiam à linha. Aquilo já não parecia um palácio, mas uma fábrica de confecções. Chegaram a trabalhar para fora.

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